terça-feira, 16 de setembro de 2008

big question mark

Só para finalizar o assunto...
Assim que terminei o post anterior fui preparar meu jantar. Já que estou praticamente chamando a casa de minha, fui escutar os cds que estavam ao lado do aparelho de som na cozinha. Fiz mais uma descoberta. Eu e seja lá quem for, temos um gosto musical parecido. Quase que posso chamar os cds de meus. Claro que há sempre aquela música que você tem vergonha de dizer que gosta. No caso irlandês não é diferente. Encontrei coisas curiosas.


Irena Cara - What a Feeling

Visualizo Robert - o operário- de polainas feitas com a mais pura lã irlandesa desbruçado sobre o balcão da cozinha chacoalhando seu quadril. Aliás, tenho toda a coreografia em minha mente, infelizmente.

beijos escandalizados,
Ellen

question mark

Antes de mais nada vou confessar que fiz uma coisa feia. Tomada por um sentimento de angústia e um pouquinho de curiosidade, adentrei ao quarto de um dos moradores. Ok, já havia dado uma olhadinha antes, mas dessa vez bisbilhotei. Foi produtivo. Encontrei ao lado da cama uma carteirinha de estudante e milhares de tickets de ônibus, Luas e Dart. O tal chama-se Robert, deve ter 20 e poucos anos e estuda no Dublin Business College (ou algo assim, não lembro mais o nome). Como todos os tickets possuem datas e destinos, deduzo que a última vez que ele esteve aqui foi no final de agosto. Ou, ele comprou um carro e abandonou o transporte público. Além disso, ele vive indo para Kildare, que segundo meus conhecimentos (limitados) geográficos é um condado perto do Condado de Dublin (onde está Dublin, claro!). Eu ainda não compreendo profundamente essa história de condado e continuo sem saber quem é de quem. Por esses e outros motivos, deduzo que o tal rapaz esteja em seu período de reclusão estudantil longe daqui. A única coisa que sei é que dia 22 de outubro ele estará de volta. Segundo informações de um cartão de retorno, nesse dia ele irá ao dentista. Já a porta do outro-e-único cômodo-provavelmente-quarto do último andar está trancada. Espero que lá não esteja Robert escondido e embalsamado.

beijos intrigados,
Ellen


P.S. Já que tal assunto foi mencionado, vou-lhes contar um pouco mais sobre os tais tickets. No caso do Luas, em todas as estações há máquinas que os vendem. Acredito que seja impossível comprá-lo em algum outro lugar ou ter algum contato físico nesse momento. A escolha é feita baseada na frequência e na distância. Ou seja, dependendo de onde v. está e para onde v. vai, o preço varia. Não há catracas ou tiozinhos para você inserir ou mostrar seu cartão. Vai na sorte. Um dia, um grupo de seres vestindo coletes laranjas pode entrar no bonde e pedir v. para mostrar o cartão. Se v. não tiver, será mil euros a menos na sua vida. É como eles dizem pay the fare or pay the price. Em relação aos ônibus, o preço também é de acordo com a distância. Não há cobradores. Como normalmente não pego ônibus, ainda não tenho toda a desenvoltura e conhecimento de tarifas. Por isso, entro, digo ao motorista onde vou, ele me diz quanto é, conto minhas moedinhas e insiro numa caixinha. Meu ticket é impresso e pronto. Para ônibus, moeda trocada e exata é o que há. Se não tiver, também não terá troco. Diria que é sistema de pagamento muito civilizado. Talvez o sonho de consumo dos nossos pula-catraca brasileiros.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Eu e Robinson Crusoé

Darlings,

Óbvio que já perdi o fio da meada. Até pensei em começar a escrever cronologicamente os fatos, mas iria endoidecer. Também tenho milhares de posts-rascunhos, mas nenhum finalizado. Claro que depois de tanto tempo, já não fazem mais sentido. Então, vamos as novidades e aos poucos vou os atualizando dos fatos passados.

Estou de casa nova! Sim, cortei meus laços pseudo-familiares e vim para um novo cafofo no começo da semana passada. Entrei na vaga de um italiano. Ele é um ex-morador tanto da casa da Susan quanto do cafofo. Depois de uns 6 meses, acho, ele voltou para a Itália. Aqui faço uma de minhas observações. Quer dizer, vale mais como um momento curioso (ou não). Em Dublin, encontrar um apartamento para dividir é um processo árduo de seleção. Tudo começa na internet. Depois é preciso agendar uma visita e é nesse momento que coisas estranhas começam a acontecer. Normalmente, várias pessoas visitam no mesmo horário e no mesmo dia. Quase que um arrastão. Como me atrasei nas minhas visitas, acabei sendo a única pessoa. Você avalia a casa e os moradores, e eles te avaliam. No final do tour há uma entrevista e você deixa seu nome e telefone. Se você for uma pessoa jóia, eles te ligam em 24h. Ou seja, pessoas com conflitos-dramáticos-internos podem ficar arrasadas. Como não sofro de tal causa, sobrevivi ao dia que ninguém me ligou. A casa tem cara de apartamento. Fica numa área bem bacaninha de Dublin, mas a rua em si parece um bequinho. Para não desvalorizar, chamo de praça. É uma rua sem saída e as casas são todas de tijolinho com as portas coloridas uma de frente para outra. A minha é vermelha. Não, não são as tradicionais casas irlandesas. Diria que se trata de uma versão mais simplista. Teoricamente, moramos em quatro. Eu, mais dois irlandeses e uma irlandesa recém-desaparecida (no lugar dela virá uma americana, sabe-se lá quando). Na prática, moro apenas eu. Sim, depois de uma semana habitando o recinto, ainda não vi ninguém! Ou seja, tenho a mesma curiosidade que vocês (?) em saber quem são. O tal do italiano disse que eles trabalham e quase não ficam em casa. Ok, mas achei que ao menos para um banhinho, dormir ou até mesmo para trocar de roupa eles voltassem. Sabe-se lá por onde andam. Diria que tal episódio está me forçando a fazer uma terapia-praticamente-forçada-e-paga-em-euros contra meus pavores. Como boa parte de vocês sabem, tenho calafrios em lugares inabitados. Agora imaginem esse tal lugar inabitado com três andares gelados, portas de vidro e um silêncio perturbador. Agora coloquem esse lugar inabitado numa cidade medieval e chuvosa. Agora me coloquem dentro desse lugar inabitado. Tá, sei que é um tanto quanto ridículo já que tenho pouca-coisa-mais do que doze anos de idade. Só que é incontrolável. Quase que não passo da segunda noite, mas resolvi aceitar o problema. Talvez eu seja mais sovina do que medrosa. Seguindo os conselhos de algum sábio chinês, já que não posso vencê-los, resolvi me juntar a eles. Tomei posse da casa. Só que na primeira oportunidade, sairei correndo de mala e cuia. Literalmente.


versão amadora da real porta irish


não faço a menor idéia de quem seja a guitarra


meu cubículo


é normal ter a máquina de lavar roupa na cozinha
(no caso é essa daí da esquerda)

Já cansada de esperar alguém aparecer e tentanto amenizar meu sofrimento, convidei minhas duas amigas coreanas para almoçarem aqui em casa. A Bora, que vocês já são íntimos, e a Soo (leia-se Su). Assim como todos os asiáticos, ela também é acanhada, só que engraçada. É quase que igual a Bora. Saímos da escola na quinta-feira passada e viemos para casa. Depois de um período de dois meses de abstinência, comi um arroz de verdade. Com cebola e tudo. E digo mais, meu arroz! Para acompanhá-lo fiz o velho conhecido-e-tradicional estrogonofe. Sempre inovando. Ok, confesso que foi mais um ato saudosista. Cozinhar estrogonofe para um bando de esfomeados (alguns-dos-meus-queridos, não sintam-se insultados). Sim, por que coreano é esfomeado. Eles comem muito e por muito tempo. A parte revoltante? Eles são todos magros e de pele boa. E como já era de se esperar, elas comeram alucinadamente. Diria que foi um estrogo-irish. Isso por que aqui não há creme de leite, e sim uma espécie de leite cremosinho e fresco que deixa as coisas um pouco mais líquidas do que o necessário. Não sei se foi estupidez de minha pessoa, mas também não encontrei molho de tomate. Apenas tomate enlatado e extrato em pasta. Sim, a sensação é de cozinhar com creme dental. Já a carne aqui é extremamente cara. O quilo de uma carne comunzinha é cerca de 16-17 euros! Momento curioso? Estava eu comendo tranquilamente quando sinto movimentos bruscos e suados ao meu lado. Era a Soo tentando cortar a carne de uma maneira oriental. Com o garfo, ela pressionava a carne contra o prato (sem espetá-la, vamos assim dizer) e com a ponta da faca, tentava desgrudar um pedaço do outro (vamos assim dizer também). Sensibilizada, a ensinei a cortar. Usamos os tais pauzinhos orientais com a mesma frequência que eles usam nossos talheres por lá. De qualquer forma é estranho imaginar que uma pessoa quase-da-minha-idade e civilizada não tenha habilidades em comer com talheres. Parece primitivo, só que justificável. Assistimos a um filme, e quando ainda terminava de fazer minha digestão, as meninas queriam jantar (!!!). Realmente não sei os que mantém estreitos. Elas trouxeram noodles coreanos. Cada uma cozinhou o seu saquinho, a Bora ficou com o picante e a Soo com o não picante (para mim, apenas menos picante). Diria que é um miojo mais elaborado. Muito saboroso. Descobri que eles comem isso no café da manhã também. Talvez seja esse o segredo. Pela primeira vez comi um pedaço de alga gigante. Diferente daquelas usadas em rolinhos japoneses ou coreanos. É espessa, dura e parecida com plástico. E também sem gosto. No fim, o que era só um almoço terminou as 22h. Diria que foi um dia cheio.


Bora e o estrogô


Soo e o estrogô

* Coisas curiosas da casa...
Como na maioria das casas irlandesas, tudo é elétrico. O chuveiro, por exemplo, é preciso apertar um interruptor antes de ligá-lo. Obviamente, se não o fizer, ele não ligará. E para fazê-lo efetivamente funcionar, nada de girar torneirinhas. É só abertar o botão power. Tudo muito moderno. Em relação ao fogão é a mesma coisa. Nada de gás. É preciso ligá-lo num interruptor e depois só girar o botãozinho que já está funcionando. Outro fato curioso e que eu ainda não entendi a utilidade, é o fato de todas as tomadas terem interruptores. Ou seja, é preciso deixá-la no on (claro!) para depois usá-la.

** Coisas curiosas da TV
Depois de dois meses, sentei em um sofá. Confesso que não só sentei, como até deitei. Sim, na homestay apenas a família tinha acesso a sala. Assistíamos TV sentados na sala de jantar. Não era de um todo ruim, mas também não passava despercebido. Os programas do Brasil são iguais ao daqui. Luciano Huck, Silvio Santos e até Márcia Goldschimidt (não faço a menor idéia de como escreva isso) é a cópia descarada e traduzida. A novela irlandesa é a pior possível. Assisti a uns 5 minutos por pura curiosidade. Mais do que isso é insuportável.

beijinhos assustados,
Ellen

P.S. Final de semana passado fui à Belfast. Aguardem novidades!

domingo, 7 de setembro de 2008

What’s the craic?

Li com dor no coração o recado de vocês. Jamais os abandonaria. Só que reconheço minha baixa assiduidade. Se ainda tiver alguma alma paciente-e-bondosa por aqui e se ainda surtir efeito, peço humildemente que me perdoem mais uma vez. Reconheço que no ritmo que vou terei que escrever memórias póstumas.


Longe de mim fazer mais promessas, só digo que tentarei escrever ao menos uma vez por semana. Ok?

Thanks a million!

beijos enrubecidos

P.S. "What’s the craic?" = expressão irlandesa para "E aí, quais são as novidades?" (leia-se crack)